quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Pornografia infantil lidera denúncias que chegam à SaferNet

O Terra Magazine revelou a existência de concursos promovidos por adolescentes, entre 13 e 16 anos, que filmam suas relações sexuais e competem para ver quais vídeos conseguem mais acessos no YouTube.

Nesta terça-feira, a reportagem discute a pornografia infantil no meio virtual, violação mais reportada, neste ano, à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, criada pela organização não-governamental SaferNet e operada em parceria com o Ministério Público Federal (MPF), o Departamento de Polícia Federal e o Disque 100 do Governo Federal.

Dos 30.601 casos que chegaram ao órgão, de 1º de janeiro a 1º de julho, 44% eram referentes ao delito. Em números absolutos, significa dizer que foram 13.472 denúncias, sendo que 9.376 teriam ocorrido no site de relacionamentos Orkut.

Diferentemente de pedofilia, que é uma perversão que leva o adulto a sentir atração sexual por meninos e meninas, a pornografia infantil é definida, pelo artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como qualquer situação que envolva menores de 18 anos "em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais".

De acordo com o presidente da SaferNet, Thiago Tavares, a "quantidade de pornografia infantil disponível na rede é muito grande". Nesta entrevista, ele fala sobre o assédio de pedófilos, principalmente, em salas de bate-papo e sobre as maiores ameaças virtuais contra crianças e adolescentes. Tavares discute ainda o controle frouxo dos pais em relação à navegação dos filhos.

- Os pais não têm a consciência de que a internet é um espaço público. De que é uma rede que hoje reúne 1,6 bilhão de pessoas, das quais 69 milhões estão no Brasil. Num universo tão grande, não é razoável supor que não vão existir crimes e pessoas que vão utilizar essa ferramenta para praticar crimes, para tentar assediar ou aliciar uma criança, para tentar expor uma criança ao risco.
Tavares reforça que, "da mesma forma que os pais precisam orientar os filhos, quando estes saem à rua, precisam orientá-los quando eles se conectam à rede".


Confira a entrevista.


Terra Magazine - De 1º de janeiro a 1º de julho, a SaferNet recebeu 30.601 denúncias de crimes praticados no meio virtual. Destas, 13.472 eram referentes à pornografia infantil, 9.376 delas estariam no site de relacionamentos Orkut.

Thiago Tavares - O problema do conteúdo ilícito no Orkut é proporcional ao tamanho do serviço. Imagine o seguinte: uma cidade com 30 milhões de habitantes. Pega essa cidade e coloca na internet. É o Orkut. São 30 milhões de pessoas interagindo, se comunicando, trocando fotos, marcando encontros, publicando informações. Então, numa cidade monumental de 30 milhões de habitantes, como o Orkut, acontecem uma média de 700 crimes sexuais contra crianças e adolescentes, por mês. É isso que os números revelam, porque depois de feita a apuração das denúncias, chegamos aos casos concretos. O número de denúncia não quer dizer, necessariamente, o número de crimes. Das páginas denunciadas, cerca de 40% são removidas pelo próprio Google, por violação dos termos de uso do serviço. Ou seja, conteúdo ofensivo ou tentativas de disseminação de códigos maliciosos, uma série de riscos.

Essa prevalência de denúncias de pornografia infantil demonstra a vulnerabilidade de crianças e de adolescentes na internet? Mostra que são fáceis de persuadir a tirar roupa diante da webcam, tirar fotos sensuais, por exemplo?

Isso indica que a quantidade de pornografia infantil disponível na rede é muito grande. Esse conteúdo, infelizmente, está disponível na internet. Ele é facilmente acessível. As crianças também estão expostas a esses links e conteúdos, o que é muito grave. O que se observa e já foi constatado é que a presença de pedófilos na internet é muito comum... Se você entrar numa sala de bate-papo e ficar meia hora, basta entrar com link, supostamente de adolescente, para ser assediado. Faça o teste. Pode entrar agora, 1 hora da tarde, que é a hora em que as crianças estão voltando da escola, estão chegando em casa, almoçam e vão para internet.

Esse é um horário crítico, com maior presença de pedófilos?

Em todos os horários há. A menor incidência é durante a madrugada. Não há horário específico.

Existe uma idade apropriada para a criança começar a navegar, especialmente, em redes sociais, serviços de troca instantânea de mensagens?

As próprias empresas que oferecem os serviços estabelecem uma idade mínima. No caso do Orkut, por exemplo, a Google baixou de 18 para 13 anos.

Quais as ameaças mais comuns a que crianças e adolescentes estão expostos na internet?


Assédio, aliciamento online, exposição a conteúdo impróprio para a idade. Não só a questão da pornografia infantil, que é ilegal, mas também a conteúdos relacionados à violência extrema, à pornografia adulta e também a experiências ligadas ao uso indevido de imagem, ao bullying.

Na sua opinião, falta supervisão dos pais?

Os pais não têm a consciência de que a internet é um espaço público. De que é uma rede que hoje reúne um 1,6 bilhão de pessoas, das quais, 69 milhões estão no Brasil. Num universo tão grande, não é razoável supor que não vão existir crimes e pessoas que vão utilizar essa ferramenta para praticar crimes, para tentar assediar ou aliciar uma criança, para tentar expor uma criança ao risco.
Da mesma forma que os pais precisam orientar os filhos, quando estes saem à rua, precisam orientá-los quando eles se conectam à rede.

O que diferencia a rua de uma rede social?

A diferença é que na rua, você não sai interagindo com todo mundo que encontra. Se um estranho pergunta seus dados pessoais, dificilmente você vai fornecer. Dificilmente, você vai dizer onde mora, onde estuda, sua idade, vai mostrar seu álbum de família. Você fornece mais informações online do que na rua. É um espaço público. Assim como nas cidades há zonas mais seguras e outras mais propensas à violência, na internet acontece a mesma coisa. Você não deixaria seu filho andar sozinho pela Cracolândia, em São Paulo. Da mesma forma que não deve deixar seu filho navegar sozinho em sites de conteúdo pornográfico infantil ou sites cujo conteúdo não é apropriado para a idade dele.

Então, o controle dos pais é frouxo?

Os pais, normalmente, trabalham boa parte do dia e os filhos acabam navegando sozinhos, sem nenhum tipo de orientação.

Quais são os espaços de formação de um jovem, de uma criança hoje?

Os dois principais são escola e família. São poucas as escolas que discutem a temática da navegação segura em sala de aula.
Outro espaço de convivência é entre os coleguinhas, da própria escola, do prédio, do clube. Esses estão sujeitos às mesmas vulnerabilidades, porque, normalmente, têm a mesma idade, estão submetidos à mesma situação. Desde 2007, a SaferNet tem realizado pesquisas mais específicas, tanto junto a pais, quanto educadores e jovens, em escolas públicas e particulares. A conclusão é essa: os pais não não estabelecem nenhum tipo de limite para a navegação dos filhos. Esse é um tema distante da sala de aula. Os professores, muitas vezes, se declaram inseguros e impotentes em relação à orientação desses jovens. Eles não sabem como abordar o tema em sala. Por isso, elaboramos um kit pedagógico, que inclui fichas, cartilha de orientação, um DVD. A ideia é que o professor, a partir desse material, consiga montar uma aula sobre o assunto. Fizemos oficinas. Foram 287 escolas mobilizadas e 4300 professores formados no ano passado.
Crianças e adolescentes brasileiros passam muito tempo conectados à internet, segundo pesquisas.

Quais consequências disso?

A experiência de crianças e adolescentes na internet é muito ativa. Principalmente, porque os serviços interativos no Brasil são um fenômeno. O Brasil é o maior consumidor do mundo, em termos de horas de navegação, das redes sociais e dos comunicadores instantâneos, que são os serviços interativos. As salas de bate-papo também fazem sucesso entre os jovens brasileiros. E são nesses espaços onde há o maior risco, porque são espaços de interação, que reúnem um universo muito grande de pessoas e, principalmente, onde as informações pessoais estão expostas, muitas vezes, de uma maneira inconsequente. O que você encontra são crianças publicando uma quantidade de dados pessoais muito grande. Divulgam onde estudam, algumas chegam a fornecer o telefone celular, marcam encontros na internet. Nas pesquisas que fizemos, 87% das crianças declararam que não sabem viver sem internet. Ou seja: elas não conseguem mais enxergar seu cotidiano, suas relações de comunicação e entretenimento sem a rede. É uma coisa plenamente incorporada ao dia-a-dia delas. E é bom que seja assim. A internet oferece uma série de oportunidades não só de entretenimento, mas de aprendizagem, informação e conhecimento, de comunicação. O principal desafio é a mudança de percepção. A partir do momento em que a família, os educadores passam a encarar a internet como um espaço público, passam a enxergá-la como um reflexo da sociedade, com tudo que ela tem de bom e ruim, a coisa muda de figura. Daí você passa a se preocupar com a segurança do filho também na rede. Não só quando ele vai à escola, ao clube, ao shopping.


Ana Cláudia Barros, Portal Terra

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